Começamos
com um “doka”
Um descanso no caminho de volta
Da Estrada Esburacada
Para a Estrada Nunca-Esburacada;
Se chover, deixe que chova;
Se ventar, deixe que vente.
Cada palavra deve ser penetrada com
simpatia... “A Estrada Esburacada” significa este mundo, o mundo dos desejos. Através
dos desejos estamos perdendo nossa energia, desperdiçando nosso ser e
desaparecendo pelo ralo.
Esse mundo é a Estrada Esburacada, e o
ser humano simplesmente se desperdiça aqui. Nada é ganho a partir dela, nunca. Na
verdade as pessoas vêm como imperadores e morrem como mendigos. Esta é uma
estrada esburacada! Toda criança nasce como imperador, e logo o reino, a pureza
e a inocência são perdidos. Cada criança é Adão no Jardim do Éden e cada uma
precisa ser expulsa do jardim; e ela começa a penetrar no mundo dos desejos.
Existem dez mil desejos, os quais não
podem ser realizados e satisfeitos. Eles trazem somente frustrações e mais
frustrações, e cada desejo é uma nova armadilha de frustração. Você novamente
tem esperança e acaba sendo pego, e cada desejo traz somente uma enorme
frustração.
Porém, no momento em que ele vem, você
começa a desejar de novo; você se move de um desejo a outro, e pode continuar
se movendo por milhões de vidas. Em realidade, é assim que temos nos movido.
O mestre Zen Ikkyu chama isso de
Estrada Esburacada. E a Estrada Nunca Esburacada, o mundo antes de nós termos
nascido ou o mundo quando nós não existirmos mais.
No Zen, esta é uma das meditações mais
básicas: procurar a face que tínhamos antes de nascermos ou procurar a face que
teremos quando estivermos mortos. Apenas pensar sobre ela traz grandes realizações;
apenas por meditar continuamente a respeito dela e a pessoa começa a sentir
algo sem feição. Esta é a nossa face original; o estado de não feição. Você não
tinha face, corpo, mente, nome ou forma antes de nascer – nenhum namarupa, nem
nome nem forma. Você era, mas não estava identificado com nada.
O objetivo de todas as meditações é
perceber isso novamente, dentre todo esse barulho da Estrada Esburacada, dentre
todas essas pessoas que estão apenas correndo atrás de desejos, perseguindo um
desejo e então um outro e um outro... Reconhecer e perceber a face original
quando você não era um corpo nem uma mente, mas somente uma consciência pura,
uma testemunha. Isto é chamado de Estrada Nunca Esburacada. Se você puder
permanecer nesse estado, suas energias de vida não se dispersarão.
E o caminho de volta é retornar a esta
fonte, a esta face original. Todas as religiões são o caminho de volta. Religião
significa uma virada de 180 graus, uma meia volta, uma meia volta completa. Estamos
correndo para longe da fonte original, estamos correndo de nós mesmos, e
precisamos retornar, precisamos chegar à nossa fonte original, pois somente ali
há paz, contentamento, bem aventurança e preenchimento.
A fonte é o objetivo – eles nunca
estão separados. Somente a fonte pode ser o objetivo! Quando a pessoa volta
para a sua fonte original, ela atinge tudo que a vida pode dar, tudo que a vida
pretende dar.
A vida é perder o paraíso e a religião
é recuperá-lo. Atirar-se no mundo dos desejos é Adão caindo da graça; retornar
é Cristo. Eles são as mesmas pessoas! Adão e Cristo não são duas pessoas
separadas, mas a mesma pessoa, somente suas direções mudaram. Adão está na
Estrada Esburacada, afastando-se da fonte, indo cada vez mais longe da fonte, e
Cristo está regressando, ele deu a volta.
A palavra cristã “conversão” significa
regressar; Conversão não significa um Hindu se tornar cristão ou um muçulmano
se tornar cristão. Conversão significa Adão se tornar cristo. Isto nada tem a
ver com o cristianismo, mas algo com o próprio estado crístico. Porque ao se
tornar cristão, você não se converteu; e nada mudou. Você era hindu e estava se
atirando no mundo dos desejos, então você se torna cristão e se atira no mesmo
mundo – mudou em você apenas o rótulo. Agora você não é mais chamado de hindu e
sim de cristão.
Conversão significa uma virada de
cento e oitenta graus – Adão regressando, o caminho de volta.
Os Budistas têm uma palavra ainda mais
bonita para isso, paravritti – que significa exatamente uma virada de cento e
oitenta graus. Menos que isso não serve. Se você errar, mesmo que por um único
grau, você ainda estará se atirando no mundo dos desejos.
E o “descanso” significa nossa curta
vida humana, tão curta que chuva ou vento e desgosto e paixão são de
consequências e significados pequenos.
A vida pode ser encontrada somente no
momento presente, mas nossas mentes raramente moram no momento presente. Ao
invés disso, nós nos voltamos ao passado ou ansiamos pelo futuro.
Pensamos ser nós mesmos, mas, na
verdade, quase nunca estamos em contato real conosco.
Nossas mentes estão muito ocupadas
remoendo as memórias de ontem ou os sonhos acerca do amanhã. O único modo de se
estar em contato com a vida é retornar ao momento presente.
E uma vez que você sabe como retornar
para o presente, você se tornará desperto e, naquele instante, encontrará o seu
verdadeiro ser.
Texto publicado em junho de 2011 e modificado em novembro de 2016
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